terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Corrida

Precisava correr. Não sabia por que. Nem pra quê. Ou melhor, até sabia, mas, no momento, essa informação fora confinada a um cantinho obscuro da vasta rede neuronal por nós conhecida como encéfalo. Sua mente funcionava assim: só conseguia se concentrar numa coisa por vez. Portanto, como agora a única coisa que importava era correr até o máximo que podia suportar, não pensava em mais nada além de enviar impulsos elétricos aos músculos da perna para que continuassem se movimentando. E assim percorria extensas avenidas, becos obscuros, ruas tranquilas de subúrbios, enfim, todos esses prazenteiros lugares encontrados em qualquer metrópole que se preze. Nosso relato podia acabar bem aqui, estendendo-se a corrida desse personagem desinteressante por um tempo indefinido. Mas (e lá vem a conjunção coordenativa adversativa, pra anular totalmente tudo o que se disse antes), só o fato de nos termos dado ao trabalho de construir esse relato evidencia que o final dessa história não foi tão simples assim. Num determinado momento, o sujeito parou de correr. Tinha um motivo pra isso, claro: ele acabara de perceber quão bonita era a paisagem ao seu redor. Como podia continuar correndo enquanto passava por magníficas lixeiras atulhadas até a boca dos mais poéticos detritos, enquanto ouvia o suave e instigante barulho do tráfego,  uma verdadeira sinfonia de buzinas e escapamentos, enquanto respirava aquele ar saturado de poluentes, em quantidade bem superior às 4000 e poucas substâncias tóxicas encontradas no cigarro? Sem contar naquele magnífico céu de inversão térmica, em que as cores da poluição superavam qualquer aurora boreal que um dia pudesse ver.E então decidiu parar e apreciar os lindos aspectos que permeavam sua existência cotidiana. Afinal, a vida é uma só, e tinha certeza de que em paraíso nenhum poderia encontrar semelhante conjuntura de singularidades como as que se lhe apresentavam naquela cidade. Estava a meditar sobre esses assuntos de profundidade inquestionável quando ouviu um estampido terrificante  e sentiu um impacto em sua nuca, logo seguido pela sensação do sangue quente escorrendo por suas costas. Foi aí que se lembrou de por que corria desabaladamente, de por que não devia parar de correr em momento algum (lembrança essa fatalmente olvidada, como bem se percebeu): estava fugindo da polícia.

4 comentários:

Fernando Neves - KroSS disse...

Meo, sério... eu corri com esse k'ra. Lendo do jeito qu'eu fiz aqui... era como s'eu corresse. Ao menos os batimentos cardíacos estavam atona! Haha. Mas é isso. Acho qu'eu não tenho mto o que comentar: está mtu bom esse texto. E aquilo qu'eu sempre falo, teus finais, por mais simples que seja deixam um texto bem mais espantoso, o final inesperado espanta qualquer um. Confesso que pensei em mil coisas menos na simples hipotese de estar fugindo da polícia. Mtu legal essa sua capacidade de finais inesperados.
aUHAUHuih!

É isso ae!
Que a inspiração me atinga tbm!
Tô seco pra escrever, mas não tenho o que escrever.
hehe!

É isso ae! Parabéns, k'ra!

"Té o próximo post!"

gabis disse...

adorei! visualizei um curta metragem MUITO FODA com seu texto. Hey Iago... vc tem o dom.

Mateus Rolim: disse...

hahahha
obrigado "La Vie En Noir" (não sei o seu nome) ueauhua
texto massa.
faloira

Thaís disse...

Tive o sentimento de todo mundo... de estar correndo com ele!
E seus contos sempre incríveis, me deixando encantada, e com uma pontinha de inveja de não ter tanta inspiração.. hahaah

Beijão :*